Diariamente ocorrem centenas de pequenos
furtos em superfícies comerciais. Os Gerentes ou Diretores destes
estabelecimentos adotaram um procedimento para os combater, dando instruções
aos seus funcionários ou vigilantes que aí prestam serviço para, no caso de os
intercetarem, chamarem as autoridades policiais.
As autoridades, por sua vez, chegavam à
superfície comercial, identificavam o alegado delinquente, aprendiam-lhes os
bens furtados, e questionavam se o representante legal do estabelecimento pretendia
procedimento criminal.
O procedimento criminal referido,
consistia na “apresentação de queixa”
contra o autor do furto. A Lei considerava este crime, como um crime
semipúblico, ou seja, bastava a apresentação de queixa por parte de quem tinha
poderes para tal, para que o processo prosseguisse para tribunal. Relativamente
a custos para o estabelecimento comercial, limitava-se a algumas deslocações à
Polícia ou a Tribunal.
Para o autor do “pequeno” furto, implicava a condenação por um crime, com todas as
implicações que daí advinham, com a agravante de ter de suportar as custas do
processo, e o eventual pagamento de uma multa.
Quando estamos a falar de furtos como o
divulgado em https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10200120285923015&set=a.1229084500359.34429.1626498567&type=1&theater,
ou seja de um valor de pouco mais de 4 €, poderemos afirmar que a Lei em geral,
e o Código Penal em particular, não estava a cumprir os seus objetivos de
prevenção geral e especial. A própria sociedade não entendia esta condenação, o
que contraria a missão primordial deste ramo do Direito. Exemplo disso está no
número de partilhas que esta publicação teve, assim como os comentários de
apoio à atuação do Agente da PSP que pagou do seu próprio bolso a despesa do
alegado autor do furto.
Nesse sentido, vem agora o legislador “dificultar” a prossecução destes
pequenos delitos para Tribunal, tornando o crime de furto (artº 203º, CP), num
crime de natureza particular quando for de valor diminuto (Lei 19/2013, de 21
de fevereiro), desde que tenha havido recuperação imediata dos bens, e mediante
determinados condicionalismos legais.
Na prática o estabelecimento comercial,
ou quem o representa, terá de se constituir assistente no processo e de se
fazer representar por advogado. Ou seja, em linguagem corrente, terá de ser ele
a seguir com o processo às suas custas, contratando advogado e pagando inicialmente
as custas de abertura do processo.
Julgo que, com esta medida, a maioria
dos pequenos furtos não passará pelas instâncias judiciais devido ao elevado
custo do processo, e à baixa probabilidade de o estabelecimento ser ressarcido
das despesas.
Uma das opções poderá passar pelo
recurso à Mediação Penal, ou a um acordo imediato entre o estabelecimento e o
autor do furto.
Contrariamente, poderemos especular se
esta medida não levará ao aumento dos pequenos furtos nestes estabelecimentos, “desarmando” os seus proprietários da
proteção que a Lei está obrigada a lhe garantir.
Apenas uma análise dos números nos
próximos tempos poderá responder a esta pergunta, isto claro, se os houver,
dado que estas situações não poderão ser contabilizadas com exatidão, pois
dificilmente chegarão às entidades oficiais.
Se por um lado temos o cidadão que furta
4 € para dar de comer aos seus filhos, e nos sensibiliza, por outro temos os estabelecimentos
comerciais que têm um prejuízo de milhares de Euros ao final do mês com estes “pequenos” furtos.
Quais serão as consequências desta
alteração ao Código Penal?
Leonel Madaíl dos Santos
Leonel Madaíl dos Santos
Jurista
Dr. Leonel Madaíl,
ResponderEliminarA minha modesta opinião é que os pequenos furtos em estabelecimentos comerciais vão diminuir, não só pelo motivo já alegado, a falta de comunicação ás autoridades, mas também, pela ação dos vigilantes e sistemas de vigilância, que se tornam mais preventivos. Os vigilantes com o apoio dos sistemas de segurança e vigilância vão intercetar os "meliantes" antes de saída ou passagem nas caixas....
Pessoalmente, a medida contemplada na nova legislação é de louvar.
Saudações académicas,
Orlando Pires
A lei não pode ser insensível as circunstâncias economico-sociais em que se aplica. Neste caso com a diminuição de tráfego de clientes e consequentemente reduçao no valor de facturação, não me parece credível que as empresas façam um investimento na segurança privada( que considero como complementar da segurança pública- mas isso são contas de outro rosário e motivo de debate para outra altura).
ResponderEliminarCaberá assim aos privados nas suas areas de negócio, através da vigilância eletrónica, quer seja através da visualização por circuito interno, quer através de alarmes dissuadirem a prática do ilícito.
O enfoque da atenção passa para montante do eventual ilícito criminal.
Por fim fica a dúvida se esta medida não ´´incentivará´´ o pequeno furto apesar do eventual estigma social que hoje em dia representa o ser-se apanhado.
Por outro lado esclareço que o cliente não pode ser intercetado antes da saída do espaço físico da loja, sendo que a prova ficaria irremediavelmente comprometida neste caso.
Saudações académicas
Nuno Lino
É curiosa a opção do legislador,perante estes furtos de deminuto valor. Tendencialmente imaginamos uma idosa desamparada a furtar meia dúzia de fatias de fiambre, ou um pedaço de pão. Sem dúvida que os jornais farão do caso escandalo nacional,o que irá decididamente ajudar a vender mais jornais... Depois teremos uma população por tascas e cafés a dizer em coro qualquer coisa como - Antes fossem prender X ou Y...
ResponderEliminarRecordo um professor que dizia " quando oiço uma das partes, sei logo de que lado é que está a razão, quando oiço as duas é que posso ficar com dúvidas".
Assim, parece-me que precisamos saber mais sobre o tipo de pessoas que praticam tais furtos - Idosos desamparados, jovens que o fazem pelo prazer da prevericação,pessoas que não precisavam de o fazer? Se é que se pode traçar um quadro que vá lançar luz sobre essa realidade.
Parece-me exagerado partir do pressuposto que quem comete furtos nesses espaços são sempre velhinhas de xaile pela cabeça e uma pensão de miséria,e infelizmente há pensões de miséria. Sendo esse o caso, não poderia haver uma colaboração, por hipótese, com a Assistência Social de modo a tentar-se resolver aquele drama social? Não podemos querer que os espaços comerciais se transformem em "contribuintes forçados para o bem estar nacional", por um lado, e por outro lado,os pressupostos valem o que valem... Já vi pessoas com pergaminhos e de boa linhagem (o que quer que isso seja), a darem boas golpadas, e gente carenciada a devolver carteiras...
Um grande abraço
Fernando Tristão da Cunha
Mais um excelente artigo do Dr. Madaíl, obrigado por partilhar connosco as suas interpretações.
ResponderEliminarMarta Gomes Palma
Sou vigilante e trabalho num centro comercial...e esse problema é constante no dia a dia...ja por varias vezes contribui no pagamento desse tipo de produtos..o ultimo foi uma senhora idosa que andava a pedir dentro do supermercado as 11h30 da manha.. onde fui obrigado a abordar pois aquele establecimento comercial nao o permitia...quando cheguei junto da senhora lhe pedi educamente que nao era permitido pedir..a senhora me respondeu que apenas queria pedir uma ajuda para comprar 6 carapaus para poder dar a dois filhos (praticamente menores e todos desempregados) e um neto que lhe pediam que ansiosamente um peixinho pois ja a meses que nao tinham o gosto do peixe..a senhora me dizendo isto a chorar eu proprio fui a peixaria e pedi 8 carapaus e fui a caixa lhe pagar..depois de pagar a senhora ainda chorou mais agora de muito feliz por ter prometido aos seus que so iria para casa depois de levar o peixe....e eu senti me muito bem com isso..ficando o resto do dia bem comigo mesmo
ResponderEliminarconsequencias da desigualdade social super-agravado pela crise...
ResponderEliminarComo cidadão considero que todas as pessoas numa situação de pobreza provocada pelos partidos políticos da maioria deviam de deslocar-se até à Assembleia da República e exigirem alimentação. É triste, ver-mos cidadãos que têm banquetes por 10 euros em restaurantes de luxo dentro das paredes da casa do povo e cá fora assistir-mos à destruição da Democracia, com a fome a atingir cada vez mais lares.
ResponderEliminarPara que servem, afinal, os "seguranças" ou "vigilantes" contratados por esses supermercados?...
ResponderEliminarSe estiverem atentos - e se os artigos forem protegidos com os habituais alarmes - poucos furtos acontecerão.
Por isso, podem ficar descansados os que defendem a prisão para os pobres e famintos... Tivesse eu filhos com fome, e estivesse sem emprego. Roubaria pão e leite, de certeza!
Podem trazer as algemas.